O Núcleo

Núcleo da terra, núcleo do saber, o centro, o eterno centro de infinito que esconde a pureza matemática do zero. Do centro irradia tudo, do centro nasce o sol e a terra, a lua e o homem. Do seu centro os astros se conhecem e o homem pretende voltar a ele. Raiando o universo atinge a sua plenitude, raiando o homem sobrevive ao caos. De frente à terra, subimos os cumes à procura e só encontramos o vazio do espaço que já sabe. E nós? Como encontrar o centro? A quem nós pertencemos? Ao mundo, ao manto do borbulhar dos sentidos ou ao profundo núcleo das ideias? Qual destas camadas está mais perto do nosso eu e do nosso ser? Quem vive nestas zonas obscuras por um negrume que tende a esconder a verdade? Volta e meia apressamo-nos a fazer história, decidimos investigar e tornamo-nos peritos do centro, insistimos veementemente à procura da verdadeira essência. Ela tem de estar lá. Com coragem e convicção, ultrapassamos todos os obstáculos. Rocha! Granito! Sedimentos antigos e câmaras geotérmicas antiquíssimas. Curiosidade e fascínio. Encontramos a cada passo mais uma razão para continuar, sentimo-nos orgulhosos, exploradores do desconhecido familiar, estamos confiantes, calcorreamos a bom passo alegres e bem-dispostos com a nova aventura, tudo se passa de uma forma simples mas mágica, estalactites e estalagmites de cavernas sem fundo, ir e vir, observar derelictos e mover pedregulhos, sem esforço, alquimia, somos o merlin da geologia, somos fortes, somos golias, agora podemos ser tudo. No nosso impulso por mais gravitação interior não nos apercebemos que essa força permeia quem vai mais longe. A força aumenta, torna-se intensa, combativa, debatemo-nos, é forte demais, agora não vai parar. A força empurra-nos e encosta-nos à profundidade seguinte, estamos presos no manto da nossa terra, infiltrados por uma corrente subterrânea de lençóis freáticos emocionais, somos pressionados, esmagados, sentimos a água como se fossem agulhas, dilacerando a nossa pele ela torna-se aquosa, mutação, transformamo-nos nessa torrente, somos água, somos fluido, deixamo-nos ir num misto de espanto e tristeza. Agora só podemos fazer uma única coisa... Escorregar até ao centro.

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